domingo, 3 de novembro de 2013

A arrogância dos macacos pelados

O espírito da sociedade moderna parece ter se tornado completamente cega para a potência monumental da natureza. Engana-se na ilusão de que já está completamente dominada pela ciência humana. Imerso em  um universo totalmente artificial, quase sempre protegido das adversidades naturais, perdeu a noção da sua impotência em face das forças brutais do universo que o cerca.

Como consequência, perdeu o contato com a realidade e vive inconsciente de que logo será engolido por um turbilhão monstruoso que o reduzirá a pó. No passado, tanto as grandes civilizações quanto as culturas de pequeno porte, deram testemunho através de sua produção cultural da sensibilidade para os grandes problemas da existência e os seus mistérios; a saber, a morte, a origem da vida e o poder brutal da natureza.

Para a perplexidade geral, em nossos tempos, declaramos superadas todas essas preocupações do antepassados. Pensamos que eles eram apenas homens primitivos, amendrotados diante de uma natureza que não podiam controlar e entender. Trivializamos a realidade.

O que antes parecia grande, belo, amedrontador, quase infinito, nada mais é do que algo trivial em grande escala. Tomemos como exemplo o mar, tão grande, tão misterioso, tão irregular, que no passado fascinou todas as sociedades. Hoje, nada mais é do que um meio contínuo, perfeitamente descritível por meio da mecânica dos fluidos.  Em princípio, a ciência é capaz de mimetizar perfeitamente todas as ondas e seus fenômenos outrora tão misteriosos. A sua bela cor nada mais é do que o efeito do padrão de absorção e espalhamento da luz das moléculas ali presentes.

Em poucas palavras, o universo inteiro foi reduzido a um amontoado enorme de partículas, com regras de interação bem definidas, e com simetrias e estruturas periódicas que se estendem por todo o espaço. Como escreveu Gustavo Corção no segundo volume de Dois Amores e Duas Cidades, o universo, nessa perspectiva, parece uma imensa cadeia, com um número enorme de celas, todas iguais, monotonamente iguais.  Tanto é verdade que até hoje nada se conseguiu além de uma literatura insossa quando tentaram fazer divulgação científica através de estorinhas (Contato de Carl Sagan é um bom exemplo). Essa perspectiva reducionista da realidade é um veneno mortífero para a imaginação.    

Ou seja, já não há mais espaço para o mistério. Está tudo compreendido, tipificado. O ser humano nada mais é do que um amontoado de moléculas escolhidas e dispostas sabiamente pela evolução de modo a interagir para compor um organismo. A vida nada mais é do que uma organização originada do "acaso". Somos frutos do acaso, compostos apenas de matéria.

Sendo tudo fruto do acaso e pura matéria, já não há mais por que buscar uma razão para o ser. As coisas simplesmente existem, as que tem vida nascem e morrem. Não há um criador, apenas a matéria e suas leis, que tudo cria, recria e tranforma.

Muito bem, nesse ponto, não posso deixar de manifestar a minha recusa a adotar tal visão de mundo.

Em primeiro lugar, a ciência ainda é incapaz de responder e prever uma infinidade de fenônemos, isso sem mencionar os fenômenos que na verdade ela não explica, apesar de muitos pensarem o contrário. Já há quase um século que a teoria que melhor descreve os fenômenos microscópicos, a mecânica quântica, ainda não tem uma interpretação "clara e distinta". Quem é físico sabe bem: ao especialista da área pouco interessa a interpretação para o sucesso de suas aplicações, o importante é saber utilizá-la.

A teoria da evolução é ainda muito mais frágil, sem contar o fato de que ela não é capaz de prever nada que não seja trivial. Essa teoria não satisfaz todos os pré-requisitos do método científico, em particular o da experimentação. Isso pelo simples fato de que, por assumir uma escala de tempo enorme, nenhum experimento pode ser feito para verificá-la. O ponto fraco da teoria é habilmente escondido, enquanto que o ponto forte é apresentado como a sua demonstração completa e irrefutável. O ponto forte é a seleção natural: ela ocorre e isso pode ser demonstrado experimentalmente. Mas isso quando a diversidade genética já está presente na espécie: ninguém até hoje explicou como, magicamente, no momento da necessidade de adaptação, havia uns indivíduos com as mutações exatamente necessárias. A mutação e a mudança no ambiente são eventos não correlacionados, de modo que a probabilidade de acontecerem simultaneamente é baixa. Por isso, a teoria exige uma quantidade monstruosa de recombinações genéticas e mutações aleatórias, isto é, muitas reproduções e muito tempo. É estranho, pois a escala de tempo da mudança ambiental é muito menor do que a exigida para a ocorrência de mutações. Talvez não no caso de bactérias e "algoritmos genéticos", mas isso está muito longe de se aplicar igualmente a seres mais complexos.

O problema está em acreditar que a ciência realmente explica tudo. Penso que o mesmo se pode afirmar a respeito da esperança de que um dia irá explicar tudo. No fundo, o verdadeiro motivo para que muitos se apeguem a essa crença é a necessidade pessoal de negar o fato de que o universo tem uma finalidade. Pois se tem uma finalidade, necessariamente teve que ser criado por um Ser inteligente. Se assim for, toda criatura deve a ele sua existência e de alguma forma está implicada no Seu projeto.

Há um enorme medo do transcendental, do grandioso, daquilo que supera a pequenez evidente da humanidade. Para os espíritos acomodados, é mais confortável se iludir na sua convicção de que sua inteligência e vontade é o que há de maior na natureza. Mas a verdade patente é que não passamos de homens pobres, nus e pateticamente frágeis. Fechamos os olhos para essa realidade e, de alguma forma, nos tornamos mais burros do que os nossos antepassados, que desprezamos.

Uma farsa monstruosa não vai anular o fato de que todos um dia terão que responder perante o tribunal do Criador pelo que fez. É bom pensar bem, pois, como sugere a analogia de Pascal, o risco de "apostar" na tese materialista é imensamente maior.    

2 comentários:

  1. Marco, não entendo exatamente o que você quer dizer quando atribui a postura materialista a pecha de "arrogante" quando, na verdade, esta trata de se abster-se em descobrir um sentido ou inteligibilidade ao universo que parte da pretensiosa interpretação do pobre homo sapiens sapiens.

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    1. Em geral, a não ser que um materialista seja deixado sem saídas, não irá admitir que apenas trabalha com modelos, e não com a realidade. Se isso acontece, então o nível da discussão já passa para um outro plano, em que as incertezas ficam patentes e todas as partes não tem outra escolha a não ser reconhecer a própria ignorância. Aí não tem espaço para arrogância.
      Mas o que costuma acontecer é que essa turma tem o hábito de adotar um certo ar de sabedoria, que se sustenta pela ironia e pelo sarcasmo. Mas na hora de verificar o conteúdo de suas idéias, dificilmente são capazes de encadear um raciocínio simples.

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