sexta-feira, 31 de março de 2017

O Projeto Condon e o UFO de Ubatuba

Na década de 60, um importante físico, chamado Edward Condon, nos EUA, foi encarregado pelo governo de conduzir a partir da Universidade de Colorado, uma investigação científica sobre os UFOs (ou OVNIs, objetos voadores não identificados).

Tendo reunido uma equipe de pesquisadores e com um orçamento adequado para a tarefa, em 1968 foi publicado um documento relatando os resultados das investigações, chamado "Scientific Study of Unidentified Flying Objects", mais conhecido como CONDON REPORT.

O documento é grande e pode ser acessado em http://www.bibliotecapleyades.net/sociopolitica/condonreport/full_report/.

A conclusão do relatório foi de que parte dos eventos estudados poderiam ser compreendidos como eventos naturais e que outra parte não produziram evidências suficientes para serem conclusivos. Além disso, conclui que a investigação de UFOs não poderia trazer nada de novo ou útil para a ciência e dessa forma estabaleceu a palavra final sobre o assunto no âmbito da ciência convencional. Nenhum estudo amplo e bem financiado sobre o assunto foi desenvolvido desde então nas universidades.

Teria sido essa a conclusão desejada pelos que encomendaram o estudo? Ou realmente o estudo chegou à melhor conclusão com os dados de que dispunha? Essas questões não são o tema do que segue, mas aos interessados há muito material na internet sobre elas.

Gostaria de tratar sobre o capítulo 3 da seção III, dedicado às evidências físicas existentes à época, em particular sobre uns fragmentos de magnésio que foram recolhidos em uma praia de Ubatuba após a explosão de um UFO sobre as águas.

De acordo com o relatório, um notório ufólogo brasileiro chamado Olavo Fontes relatou sobre a carta que um indivíduo que estava pescando em Ubatuba escreveu  ao jornalista brasileiro Ibrahim Sued. Nesta carta, o pescador conta que não acreditava em UFOs, mas que teria mudado de opinião ao testemunhar um evento espetacular. Estavam ele e alguns amigos pescando em Ubatuba quando repentinemante avistaram um disco voador. O UFO se aproximou da praia a uma velocidade incrível e uma colisão parecia iminente, mas ao estar quase tocando as águas o objeto fez uma manobra brusca e começou a subir para cima. Eles estavam seguindo aquele espetáculo com os olhos quando a nave repentinamente explodiu, espalhando vários fragmentos que depois foram recolhidos e analisados por entidades brasileiras.

De acordo com o laudo das análises feitas no Brasil, tratavam-se de fragmentos de magnésio com uma pureza ímpar, que não poderiam ser produzidos com a tecnologia da época (anterior a 1957).

As amostras foram então analisadas no âmbito do projeto Condon, e comparadas com uma mostra da mesma época fabricada pela Dow Chemical, com o máximo de pureza que eles eram capazes de produzir. O resultado mostrou que as amostras da explosão continham impurezas de Mn, Zn, Cr, Cu, Ba e Sr em graus muito mais elevados (ver tabela). A análise foi realizada por meio de espectrometria gamma. Além disso, foi realizada uma análise por ativação de neutrons para verificar a composição isotópica, pois resultados anteriores pareciam indicar que o fragmento só continha Mg26. No entanto, neste novo estudo não foram encontradas diferenças significativas entre as amostras em seu conteúdo isotópico. 


Aparentemente, se pudermos confiar nos resultados da análise, não havia nada de muito especial, salvo o fato de haver uma porcentagem apreciável de estrôncio, já que métodos tradicionais de produção do magnésio não geram esse tipo de impureza. Foram então feitas análises metalográficas e de microssondas  nas amostras, nos laboratórios da Dow Chemical, da onde se concluiu que o estrôncio estava distribuído uniformemente e com toda probabilidade foi adicionado intencionalmente. No entanto, a análise metalográfica revelou a presença de grãos relativamente grandes e alongados de magnésio, da onde se concluiu que o material não foi trabalhado após a sua solidificação. O relatório colocou então em dúvida a possibilidade de tal material ter sido parte de um objeto de metal fabricado, em frontal contradição com o que tinha sido concluído a partir da distribuição uniforme do estrôncio. O relatório mencionou também que a Dow Chemical antes de 1957 produzia ligas de magnésio contendo estrôncio. Uma delas teria exatamente a mesma concentração de estrôncio que a amostra proveniente da explosão.

Por fim, o relatório concluiu que a alegação de se tratar de um material que não poderia ter sido fabricado à época teria sido definitivamente descartada.  Além disso, acrescentou que a amostra não apresentava composição única e desconhecida, e que portanto não poderia ser utilizada como evidência válida de origem extra-terrestre. 


Atualmente, um pequeno grupo chamado Rede Brasileira de Pesquisas Ufológicas tem em mãos algumas amostras dos fragmentos produzidos no evento citado acima e, até onde sei, estavam tentando arrecadar fundos para analisá-lo. Não sei se já conseguiram os resultados.

Terminamos o texto com a resposta do relatório Condon e deixamos ao leitor  o encargo de tirar as suas próprias conclusões e seguir adiante com sua investigação pessoal.   
   
Elemento Dow Mg.(ppm) Brazil UFO (ppm)
Mn 4.8(5) 35(5)
Al não detectado (< 5) não detectado (< 10)
Zn 5.0(10) 5.0(10).102
Hg 2.6(5) não detectado
Cr 5.9(12) 32(10)
Cu 0.40(20) 3.3(10)
Ba não detectado 160(20)
Sr não detectado 5.0(10).102
   

quinta-feira, 30 de março de 2017

Seria a Física um Arbitrário Cultural?

Recentemente me deparei com um trabalho intitulado "A Física como uma construção cultural arbitrária: Um exemplo da controvérsia sobre o status ontológico das forças inerciais", publicado na Revista Brasileira de Educação em Ciências (link no final). O artigo procura argumentar a favor da tese de que a física é uma construção cultural arbitrária. 

O conceito de arbitrário cultural foi extraído do trabalho do sociólogo Pierre Bordieu. Arbitrário aqui não tem o significado de aleatório. Está mais próximo do exercício de um juiz em um jogo de futebol, isto é, o exercício do juízo com base em um código mediado ou criado pela cultura.

Neste sentido da palavra, a ciência tem algo de arbitrário. Assim como um juiz se baseia em uma regra, a ciência também tem suas próprias regras para arbitrar. Mas essas regras não são exclusivamente culturais, pois é necessário que haja um elemento transcendente à cultura na metodologia científica. Sem este elemento, não há como conectar ciência com realidade. Realidade, por sua vez, não pode ser arbitrada e não é um arbitrário cultural.

Voltamos ao exemplo do jogo de futebol. O fato a ser arbitrado não é arbitrário. Dois juízes apenas podem discordar nos seguintes casos, a saber: fatos mal entendidos; fatos sem punição prevista; desvios simultâneos e intensidade da punição. Mas concordam quanto à regra. E concordam quanto à existência de apenas um entendimento possível e válido do fato. Por exemplo: se o bandeirinha diz que um jogador pois a mão na bola, o juiz vai querer saber quem foi, quando e onde. Se o outro bandeirinha disser que não houve mão na bola, então o juiz não poderá aceitar as duas versões como sendo interpretações igualmente válidas do fato. Uma delas é verdadeira. O fato é único.

Os cientistas precisam acreditar na existência da realidade objetiva e da ordem subjacente ao seu objeto de estudo. Se não fosse assim, o empreendimento científico não teria razão de ser, pois se os fenômenos físicos não tivessem uma ordem intrínseca, seria inútil e infrutífera a busca por ela. 
Agora, se de fato não existisse tal ordem, o cientista teria que se limitar apenas ao arbítrio ou mera escolha em suas teorias. Mas que formulação teórica arbitrária de uma ordem imaginada seria capaz de realizar previsões acertadas a respeito de uma ordem ontologicamente inexistente?

Portanto, a ciência e a física em particular não é um arbitrário cultural, embora possa ter elementos arbitrários em suas teorias. Tais elementos podem deixar de ser arbitrários. Consideremos o seguinte exemplo.

A ciência acumulou uma quantidade enorme de evidências indiretas quanto à existência de átomos. Nos seus estágios mais primordiais, a hipótese atômica ainda tinha um caráter arbitrário. Mas hoje os efeitos físicos em escala atômica detectados pelos microscópios de força atômica não deixam dúvida quanto à realidade objetiva do modelo atômico. Trata-se de evidência direta.

O arbítrio quanto à realidade do modelo atômico deixou de ser "cultural" para ser "factual".

Os elementos da cultura de uma civilização sem dúvida desempenham um papel importante na ciência. No entanto, reduzir a ciência e sua metodologia ao conceito de arbitrário cultural é inaceitável.

Caso fosse aceitável, seríamos obrigados a reconhecer que a teoria atômica só prevaleceu por causa do grito de seus proponentes. Mas a história da ciência jamais poderia ser lida nessa óptica sem com isso desrespeitar a veracidade dos acontecimentos. A teoria atômica teve muitos oponentes. No entanto, o número de evidências experimentais era tão grande, tão vasta, que muitos deles foram convencidos pela força dos fatos e não da cultura. E se hoje há evidências diretas, então teria sido uma feliz coincidência a vitória dos atomistas? 
Apresentar a física como um arbitrário cultural a qualquer um, quanto mais um estudante, não poderia ser feito sem ferir desde a base o seu potencial para a produção de ciência. Se a física é um arbitrário cultural, qual o sentido de seguir uma carreira que consiste em dar suporte à arbitrariedade ou criar novas?
 
A aplicação de tal conceito ao ensino pode ser profundamente prejudicial. No entanto, não queremos com isso desqualificar ou desmerecer o trabalho. Tais esforços contribuem para a percepção dos professores e alunos quanto à existência de elementos arbitrários na teoria, trazendo à tona problemas mal resolvidos, que, por sua vez, ao serem trazidos à tona, podem engendrar aperfeiçoamentos ou favorecer mudanças de paradigmas.  Se por um lado reconhecemos este mérito, por outro, rejeitamos terminantemente a tese de que a Física é um arbitrário cultural tal como entendido por Pierre Bourdieu.

Se no passado a Física era tomada como modelo para as ciências humanas, não deixa de ser curioso que cientistas das humanidades estejam preocupados em modelar ou caracterizar as ciências naturais com conceitos engendrados nas ciências humanas, em contextos bem diversos. Haveria uma arbitrariedade cultural neste esforço?
link: https://seer.ufmg.br/index.php/rbpec/article/view/2512

Nota posterior (fev/2019): Por teoria atômica entende-se aqui sua versão moderna, de acordo com a qual a matéria é composta por pequenas partes potencialmente isoláveis do todo macroscópico, de carga elétrica neutra, composta por um núcleo positivo pesado e uma distribuição de partículas leves, chamadas de elétrons - de carga negativa. Não se deve confundir com o atomismo grego, de acordo com a qual tais partes são efetivamente indestrutíveis, inseparáveis e precisamente localizadas no espaço. Até hoje, não há consenso sobre a existência de partículas totalmente inseparáveis, e a teoria atual sobre as partículas as descrevem como campos.   

Sobre a fusão a frio

Em 23 de Março de 1989 Martin Fleishmann e Stanley Pons teriam divulgado ao mundo uma das descobertas com maior potencial tecnológico e científico de todos os tempos: a fusão a frio. Os alquimistas estariam de volta!

De acordo com a ciência atual, acredita-se que para que as reações de fusão nuclear ocorram, é necessário aquecer um meio (um plasma) contendo deutério a uma temperatura da ordem de um milhão de kelvin. Esse número poderia ser menor, dependendo da densidade ou tempo confinamento desse meio, mas em todo caso sempre envolveriam temperaturas muito mais elevadas do que a temperatura ambiente. 

À época, muitos cientistas chegaram a acreditar na autenticidade dos resultados. Nada mais nada menos do que Julian Swinger, prêmio Nobel e lendária figura na física chegou a submeter um artigo dando embasamento teórico para a descoberta. Seu artigo foi recusado, o que teria levado Swinger à época a sair da sociedade americana de física.

Hoje ainda há alguns cientistas que continuam acreditando nos resultados da fusão a frio. No entanto, a ciência "mainstream" já clássifica a fusão a frio como "ciência patológica" e dificilmente um governo aprovaria verba para pesquisa nesta área.

Ao que tudo indica, há boas evidências contra a fusão a frio. No entanto, seus proponentes, incluindo Fleishmann e Pons, não se retrataram apesar de terem enfrentado um duro opróbrio da comunidade científica do "mainstream". Depois disso, ainda foram apoiados pela Toyota para continuar sua pesquisa, mas aparentemente não chegaram a resultados conclusivos.

Algo me faz suspeitar que nem todo conhecimento e tecnologia desenvolvidos pelas empresas se tornam públicos. Estariam as indústrias à frente das Universidades não só em termos de tecnologia, mas de conhecimento científico?

terça-feira, 28 de março de 2017

Crítica sobre a Mecânica Relacional

Em 2001, os professores Carlos Escobar e Vicente Pleitez escreveram um artigo na Revista Brasiliera de Ensino de Fìsica contendo uma crítica ácida e contundente a uma revisão favorável ao livro "Mecânica Relacional" de André Assis publicada na mesma revista.

A crítica deles pode ser acessada gratuitamente em http://www.scielo.br/pdf/rbef/v23n3/v23n3a02.pdf.

Os autores não moderaram as palavras; disseram explicitamente que o autor, prof. André Assis, não tem credibilidade em razão do fato de não publicar nas revistas especializadas de maior prestígio e reconhecimento nas comunidades especializadas da física.

Eles utilizam o argumento válido de que a eletrodinâmica de Weber, defendida por André Assis, parece não casar bem com a teoria quântica de campos e a eletrodinâmica quântica. A última é a teoria da física cujos historiadores da ciência consideram a mais bem sucedida em suas previsões.

No entanto, não analisaram os detalhes da Mecânica Relacional, não fizeram nenhuma busca por inconsistências internas, não comentaram sobre os possíveis méritos da nova abordagem, etc. Simplesmente afirmaram que tal teoria não produz nenhum resultado novo já que seus resultados coincidem com a mecânica Newtoniana em um referencial na superfície terrestre.

Pouco tempo depois, os Graneaus, pai (Peter) e filho (Neal) escreveram um artigo para a revista "General Relativity and Gravitation", em que fazem uma revisão das teorias que implementaram o princípio de Mach, incluindo a de Assis.
Vale a pena conferir.

link: http://rdcu.be/qsdy

quarta-feira, 22 de março de 2017

Mecanica Relacional, Mach e eletrodinâmica de Weber


De acordo com o princípio de Mach, a massa do Universo, incluindo as galáxias distantes, afetam os movimentos dos objetos na Terra.

Leibnitz, contemporâneo de Newton, acreditava que a única grandeza que poderia importar na descrição dos movimentos era a distância relativa entre os corpos.

A mecânica de Newton nos acostumou a ver o universo como um grande aquário imaginário no qual o Universo está imerso. Mas seria possível descrever toda a dinâmica dos corpos apenas pela relação entre as distâncias dos corpos?

De acordo com a Mecânica Relacional de André Assis, sim.

Sua teoria é uma aplicação radical do princípio de Mach, acrescida de uma versão gravitacional da eletrodinâmica de Weber.

Um de seus principais resultados é que a massa inercial é igual à massa gravitacional, por primeiros princípios. Mais do que isso, o termo (massa x aceleração) da segunda lei de Newton resulta de uma espécie de reação da massa do Universo distante ao movimento da partícula local.

A teoria é consistente e merece ser levada à sério. Pode ser falsa, mas um pequeno esforço para compreendê-la e buscar suas possíveis inconsistências vale como um exercício mental.

link:
http://www.ifi.unicamp.br/~assis/Mecanica-Relacional.pdf



terça-feira, 21 de março de 2017

Sobre Einstein e a fórmula E0 = m0c2


Você e eu fomos ensinados que Einstein provou a equivalência entre massa e energia $E_{0} = m_{0}c^{2}$.

Na realidade, as provas que Einstein apresentou ao longo de toda sua carreira são inconclusivas. Ele estava convencido da validade do resultado, mas a idéia de que todos os resultados da relatividade restrita podem ser deduzidos de alguns poucos teoremas básicos foi desafiada pela dificuldade de obter uma dedução geral de que $E_{0} = m_{0}c^{2}$.

Até hoje, não encontrei uma só dedução, mesmo em livros, que não pudesse ser colocada em dúvida. Você já?