domingo, 23 de dezembro de 2012

Um Tempo de Luz e Esperança

Qualquer um que resolva olhar friamente a realidade que o cerca, será obrigado a reconhecer que agimos como se o essencial para o nosso sucesso fosse o dinheiro, o poder e o sexo. Nossas grandes miragens de felicidade sempre envolvem esses três elementos. De fato, são esses os requisitos necessários para a satisfação dos apetites. Se alguém os tivesse sem limites, então também não haveria limites para a satisfação nem tampouco margem para o sofrimento.

Muitos já devem ter imaginado um mundo onde todos os apetites pudessem ser satisfeitos assim que brotassem. E alguns devem ter chegado à conclusão de que, se esse lugar existisse, então aí teria que ser o paraíso. E outros mais talvez até tenham chegado a pensar que, se fossem eles mesmos Deus, fariam um Universo para satisfazer os apetites das criaturas com delícias sem fim. E porque o universo não é assim, outros ainda tem  chegado à conclusão de que Deus não passa de um delírio.

Mas não é um delírio. Quando Deus veio à terra, prescindiu da segurança que o dinheiro e o poder podem dar. Nasceu em uma família pobre e impotente aos olhos do mundo. Desse modo, Deus Pai ensinou através dos acontecimentos regidos pela sua providência aquilo que o seu Filho viria a ensinar através de atos e palavra.

Agora é a hora de dar uma pequena pausa às ocupações para contemplar o menino-Deus. Ele tem algo muito importante para nos dizer e bem sabemos que precisamos ouvi-lo. Se Ele prescindiu desses bens cuja falta nos angustia, talvez tenha sido para nos ensinar que não é isso o que realmente importa. Há algo maior, além desse mundo e maior do que ele, que não vemos, mas existe. Esse menino que nasceu pobre veio trazer o testemunho desse outro mundo. Se tivesse chegado ao mundo dentro do mais rico palácio e no mais poderoso reinado, não poderia ser Deus. Mas nasceu pobre, em sinal claro aos corações dos homens de boa vontade, que se enchem de esperança ao contemplar a infinita bondade de nosso Deus.       

domingo, 16 de dezembro de 2012

Monster

Os desentendimentos e conflitos entre o homem e a mulher sempre existiram e estão impressos nos costumes de todas as culturas humanas. As razões por trás desses conflitos são bastantes complexas e não podem ser reduzidas a uma única e simples explicação, como a bem conhecida tese de cunho marxista que transpõe a luta de classes na sociedade para o âmbito da relação entre homem e mulher. Existem outros elementos muito mais relevantes para a explicação desse fenômeno, pois a psicologia e a natureza animal e espiritual do ser humano precedem a sociologia na ordem das causas.

Esse conflito entre homem e mulher constitui uma das maiores tragédias que tem afligido constantemente e sem cessar toda a humanidade. É trágico pois a forte necessidade de reciprocidade entre os sexos fica frustrada, gerando um enorme descontentamento que se projeta para além da esfera pessoal e atinge toda a sociedade. Uma sociedade não pode ser saudável sem a harmonia nas relações entre homens e mulheres.

Há muitas facetas e sintomas dessa doença em nossa sociedade, e por enquanto gostaria de me restringir a apenas uma delas. Ultimamente, não tem sido nada incomum encontrar pessoas dominadas por um ódio generalizado pelo sexo oposto A razão para esse fenômeno é o que em um post anterior designei de frustração do amor.

Pela sua própria natureza, o ser humano encontra na pessoa do sexo oposto o receptáculo para todo o seu potencial afetivo. Em outras palavras, ele tem a expectativa de encontrar um outro a quem possa entregar a si mesmo sem reservas, recuperando-se a si ao receber também sem reservas aquele a quem se entregou.

No entanto, boa parte de nossa sociedade se tornou descrente da possibilidade da existência desse outro. Ninguém mais acredita em "princípes encantados" ou em "belas adormecidas". Na realidade, todos em algum dia de suas vidas acreditaram sim em seu "princípe encantado" e em sua "bela adormecida". Porém, a frustração dessa expectativa, que sempre existiu, mas que hoje em dia é mais comum devido à forte presença do egoísmo na sociedade atual, leva as pessoas à descrença total na lealdade do sexo oposto. Frases do tipo "os homens não prestam" ou "toda mulher é vagabunda" refletem essa frustração.

Essa frustração pode adquirir contornos realmente trágicos. Entre os homens, o ressentimento e o ódio tem frequentemente os conduzido à violência brutal contra a mulher. No caso das mulheres, o mesmo ressentimento as conduzem a um desprezo que não perde nenhuma oportunidade para aniquilar o homem afetivamente frágil que cai nas suas garras.

Essas matanças de pessoas inocentes empreendidas por homens armados tem a mesma raiz, que é essa frustração do amor agravada e jamais superada. Essa é uma tese forte, que não vou provar agora, mas que em algum momento pretendo discutir com maior detalhe. Limito-me a apontar alguns indícios. O assassino do realengo, por exemplo, foi seletivo ao escolher as suas vítimas, meninas. Recentemente, a polícia impediu uma ação de dois jovens indivíduos que pretendiam explodir uma bomba em uma festa cheia de estudantes universitárias de humanidades "pra-frentex". Breivik, da Noruega, carrega uma clara frustração que remete aos traumas da sua infância relacionados com a ruptura de sua família.

Pensando sobre o assunto, lembrei-me de um filme que retrata a história real de uma prostituta que realizou assassinatos em série. O filme se chama Monster e não o recomendo para ninguém, apesar de retratar uma realidade que ensina muito sobre aqueles efeitos trágicos a que me referi. Aquela prostituta foi pouco a pouco acumulando um enorme ódio contra os homens em geral. Isso é 100% compreensível, pois se uma mulher não tem a experiência do encontro com homens verdadeiramente ternos e desinteressados, capazes de amar, e é constantemente tratada por eles como um objeto descartável, então entendo o seu ódio. Mas o ponto alto do filme acontece quando a prostituta encontra um homem que na verdade apenas se dipôs a lhe dar uma carona e não tinha a menor intenção de usá-la. Aquela mulher, mesmo percebendo a boa intenção do homem, decide assassiná-lo, levando o seu carro e o seu dinheiro.

O encontro com um homem realmente desinteressado não foi capaz de humanizar o seu coração já há muito tempo endurecido. Como o seu coração de mulher tinha essa necessidade de amar e ser amado, ela encontra em uma parceira do mesmo sexo essa pessoa com quem possa desenvolver todo o seu potencial afetivo. O filme mostra que na relação com essa outra pessoa, aquele "monstro" se transforma em uma mãe terna e boa. Ou seja, na incapacidade de entrega a um homem, que seria o único modo natural e verdadeiro de encontrar a felicidade relacional, ela tem de transpor esse desejo frustrado de realização a um relacionamento postiço e artificial com uma outra mulher. Aquele acontecimento simboliza o estágio desse processo; ela preferiu matar um homem que se dispôs a ajudá-la e utilizar o espólio para nutrir um relacionamento vicioso que a mantinha naquela situação miserável.

Hoje entendo bem por que motivo São João Batista e depois Jesus Cristo moveram muitas prostitutas à conversão. Neles, e de maneira muito contundente em Jesus, elas encontraram um homem terno, desinteressado e casto que as acolheu sem massacrá-las com acusações e penalizações pelos seus pecados. A verdadeira imagem do homem rehumanizou o coração daquelas mulheres e as recordou da sua vocação para o Amor. Não é nada indiferente o fato de Jesus ter se deixado tocar pela pecadora arrependida. Mas isso já é algo que mereceria um tratamento muito especial em algum outro post...             

   

      


           

domingo, 9 de dezembro de 2012

A Esterilidade Ambientalista

Está presente no discurso de muitas ideologias, ainda que de maneira implícita, um sentimento de desconforto com o tamanho da população humana. Por trás de um discurso aparentemente legítimo baseado na preocupação com a escassez de recursos e danos ao meio ambiente, reside na realidade um núcleo interno de motivações totalmente egoístas e muitas vezes misantrópicas.

O discurso ambientalista atual incluiu entre as suas premissas a noção de que o ser humano é apenas mais um animal da terra. Se foi capaz de se impor como a espécie dominante no planeta terra, cuja população nenhuma força da natureza é capaz de controlar, então seria justo da parte da própria humanidade controlar a sua população em solidariedade ao ecossistema colocado em risco por esse crescimento.

Esse tipo de pensamento gera um sentimento de desconforto na sociedade e também no indivíduo, que é levado a imaginar-se culpado por essa suposta destruição da natureza. Levado ao extremo, esse raciocínio ambientalista reduz a sociedade humana a uma praga fora do controle que deve ser parcialmente eliminada. Lembra-me a postura do Mr Smith no filme Matrix, ao descrever a humanidade com desprezo, comparando-a a uma infecção viral sobre a terra.

Põe-se em evidência então essa nota perigosamente misantrópica implícita no discurso ambientalista. O mais paradoxal é o fato dessa mentalidade ser mais comum entre pessoas mais jovens. De fato, até algumas décadas atrás, boa parte da população ainda teve uma experiência real da natureza e sabe como ela muitas vezes é extremamente hostil ao esforço humano pela sua subsistência e dos seus parentes. Totalmente distanciados desse dura realidade graças ao avançado grau de desenvolvimento técnico da sociedade atual, a maioria dos jovens desconhece completamente a dureza da relação dos seus antepassados com a natureza. Seduzidos por uma visão pueril e nostálgica das belezas naturais do planeta terra, que lhes parece estar sendo privadas pelo mundo moderno, que as destrói e despreza, aderem de maneira irrefletida às premissas da ideologia ambientalista.

Se por um lado é legitima essa preocupação com a qualidade do meio ambiente em que vivemos, às vezes escapa à ideologia ambientalista que, na realidade, o centro dessa preocupação é o próprio ser humano. Nenhuma outra criatura do planeta terra está "preocupada" com o meio ambiente. Ao preocupar-se com o meio ambiente, o indivíduo está interessado na sua qualidade de vida e dos seus iguais. Nenhum indivíduo pode esquecer de ponderar que a sua própria existência é uma pré-condição para o interesse pela conservação do meio ambiente. E também que a sua existência é um fator de pressão sobre a natureza, não apenas a dos que estão para nascer.

Portanto, propor a limitação da existência humana, através do controle populacional, como solução ao problema ambiental é um contra-senso. No fundo, significa dizer que, para que os vivos tenham uma qualidade de vida superior, então que se limite a oportunidade de novas vidas humanas virem à luz. Em outras palavras, seria como dizer: "queremos que nossos filhos tenham um mundo melhor e para isso é necessário não deixar alguns deles nascerem". A pergunta crucial é essa: será que o melhor é que, para que alguns possam viver em um mundo "preservado", muitos que poderiam vir à existência nunca tenham a chance de nascer?

Na realidade, trata-se de uma questão de generosidade. A natureza nos diz claramente que não gosta de limitações, e nos demonstra isso até a exaustão através de incontável quantidade de entidades produzidas em seu seio (quem não se admira da inimaginável quantidade de galáxias e estrelas presentes no universo?). A natureza é uma abundância de generosidade que, no fundo, incomoda os corações mesquinhos. Quem realmente ama o ser humano e é alguém a quem realmente se pode classificar como humanista, bem sabe que a preservação do meio ambiente não é um pretexto válido para a limitação da população humana.



               


sábado, 1 de dezembro de 2012

Separará uns dos outros

Há uma passagem do Evangelho que sempre me deixou bastante intrigado e desde o início tem me causado uma surpresa positiva. Trata-se da passagem de São Mateus em que Jesus fala sobre a separação entre os homens no juízo final (Mt 25, 31-46). Nessa passagem Jesus deixa claro qual será o critério de separação entre os homens. E, para minha surpresa, Jesus não separa os homens entre os observantes da lei e os transgressores, mas sim os separa entre aqueles que praticaram obras de misericórdia ("tive fome e me destes de comer, tive sede e me destes beber")  e os que nunca a praticaram.

Ao longo da minha caminhada tenho observado que muitos de nós estamos muito mais preocupados em observar os mandamentos do que praticar as obras de misericórdia. Tantas vezes me decepcionei ao testemunhar que pessoas que fazem oração diária, vão à Missa todos os dias e vivem escrupulosamente todos os preceitos da lei, tantas vezes olham com completa indiferença ou até desprezo a esses pequeninos a que Jesus se refere.

A realidade nos mostra que esses pequeninos nem sempre são pessoas agradáveis. Um mendigo em situação de necessidade não é alguém agradável. Estará cheirando mal, poderá ser rude no trato e extremamente inconveniente. Mas se está passando sede ou frio, e há a possibilidade de remediar a sua situação, todos esses inconvenientes não são desculpas válidas para que um cristão deixe de oferecer ajuda.

Algumas pessoas se enganam achando que um dia toparão com um galã perfumado e bem educado, sedento e faminto, implorando meigamente por socorro. Isso não existe no mundo real. No mundo real, os necessitados às vezes também reagem com rudeza, ingratidão e até com maldade àqueles que oferecem ajuda.

Há alguns anos atrás ouvi uma pequena história que me tem feito pensar sobre a atitude de alguns cristãos.    

Em uma cidade perdida em um país distante havia uma família cristã que construiu uma grande casa para os seus jovens filhos. Todos viviam bem ali e praticavam os preceitos da sua religião na mais escrupulosa observância. Havia um belo jardim no pátio de entrada da casa, mas certo dia a pureza daquele local foi atormentada pela presença inconveniente de um mendigo que ali se instalou. Não sabendo como reagir diante daquela situação, um dos filhos teve a brilhante idéia de jogar sobre o homem um balde de gelo. Se recuperando do choque, o mendigo bradou: "vocês são judeus, não cristãos!".

Aquele mendigo não poderia ter sido mais preciso. Aqueles filhos estavam muito preocupados em observar as leis, mas nenhum deles soube olhar para aquele mendigo com o olhar de Cristo. Podemos imaginar como a mãe do mendigo o olharia na situação. Uma coisa é certa: o olhar de Cristo seria ainda mais compassivo do que o da mãe.

A história continua. Um outro filho, compadecido da situação do mendigo, foi conversar com aquele homem. Explicou a situação para ele e deu atenção ao que o mendigo dizia, que  apesar de tudo continuava sendo insistente e teimoso. Por fim, convenceu o mendigo a ir para um abrigo e o levou para lá.

É triste dizer isso, mas a primeira parte da história é verídica; a segunda, fictícia.